As eleições gerais deste ano no Brasil quase se assemelham ao clímax da temporada de maior audiência de um programa de drama político. O primeiro turno aconteceu em 2 de outubro, e um segundo turno em 30 de outubro decidirá os destinos políticos dos candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (mais conhecido como Lula) e Jair Bolsonaro. Não é exagero dizer que eles são arqui-rivais, com seu confronto cara a cara caracterizado como “um drama que está em construção há anos”. (BBC News) Eles não poderiam ser mais diferentes em termos de ideologia ou díspares em suas prioridades de governo. Bolsonaro, o titular, se retrata como nacionalista e populista, proclamando o lema da extrema direita “Deus, família e país”. As tábuas centrais de sua plataforma abrangem a liberdade de prática e expressão religiosa (assim como o apoio a correntes tradicionalistas do cristianismo), o direito de possuir armas de fogo e o capitalismo desregulamentado. Lula, por outro lado, é visto há décadas como um decano do pensamento esquerdista brasileiro e um dos veteranos mais reconhecidos da política de esquerda latino-americana.
A principal preocupação dos candidatos é o tratamento e o futuro da floresta amazônica, coloquialmente conhecida como os pulmões da Terra. Embora as políticas ambientais de Lula durante seu mandato presidencial de 2003 a 2010 tenham sido um recorde misto, ele ainda é a escolha preferida entre os ativistas climáticos, que alertam que a reeleição de Bolsonaro significaria mais exploração econômica do ecossistema da floresta tropical. Lula declarou que reforçará medidas para proteger as florestas tropicais. Se ele derrotar Bolsonaro no final de outubro e cumprir suas promessas de campanha, a perda de 75.960 quilômetros quadrados de floresta amazônica até 2030 poderá ser evitada. Em seus primeiros três anos como presidente depois de assumir o poder em 2019, Bolsonaro eliminou 34.018 quilômetros quadrados de floresta tropical – uma área maior que a Bélgica.
Há boas razões para acreditar que é possível ir além da dicotomia cada vez mais tênue de preservar empregos versus proteger o meio ambiente. O valor econômico percebido das indústrias de combustíveis fósseis é aceito na economia convencional como simples senso comum. No entanto, as fontes de energia mais poderosas e duradouras já são conhecidas por nós: o vento, o mar, o sol e, claro, os ecossistemas florestais. Com uma gestão sólida, eles podem fornecer energia renovável quase infinita e manter o potencial de crescimento econômico. Existem poucos sistemas de floresta tropical que podem se igualar à Amazônia, apesar do contínuo desmatamento, extração de madeira e ataques aprovados por empresas contra seus administradores indígenas.
Virgílio Viana, diretor geral da Fundação para a Sustentabilidade da Amazônia, sugere que uma “bioeconomia” não é apenas um ideal, mas um modelo prático e benéfico para o Brasil e para a Amazônia. Uma bioeconomia denota um “conjunto de atividades econômicas relacionadas a cadeias produtivas baseadas no manejo e cultivo da biodiversidade nativa. Inclui a cadeia de valor de biocosméticos, biofármacos, bioquímicos, fibras e outros produtos.” (International Institute for Environmental Development) Nessa visão, a economia floresce não em tensão com a preservação da biodiversidade, mas Porque a própria economia está voltada para o avanço da biodiversidade. Embora o investimento e a inovação sejam sempre desafios, já existem exemplos concretos de uma bioeconomia amazônica, como o manejo sustentável do pirarucu amazônico, que levou a uma recuperação de 427% dos estoques pesqueiros, ou o manejo do açaí, que injetou receita anual de US$ 1,5 bilhão no estado brasileiro do Pará.
O budismo acumulou várias tradições e costumes que, em conjunto, fazem um bom argumento de que a construção de um ambiente e economia sustentáveis representa o Modo de Vida Correto para o século XXI. Meio de vida correto é aquele que minimiza os danos aos outros e ao meio ambiente e, inversamente, maximiza os benefícios e o respeito pelos outros e pelo mundo em geral. Temos, no Jatakas e na história de vida tradicional do Buda, vislumbres da relação única do Abençoado com a natureza. Sabemos que durante séculos, mesmo quando as primeiras cavernas escavadas na rocha na Índia e ao longo da Rota da Seda foram esculpidas para os monges se abrigarem e adorarem, a ordem budista era completamente móvel. Monges e freiras estavam constantemente em movimento, com uma pegada ambiental mínima, permanecendo parados apenas durante o vassa (recuo das chuvas). Outros ensinamentos que estabelecem o budismo como uma tradição pró-ambiente e pró-bioeconomia incluem a ideia da natureza búdica (tathagathagarba) que se manifesta em todos os seres vivos, uma apreciação filosófica da interconexão do mundo e a noção de que renascemos como seres vivos sem fim. Embora a noção de mordomia da Terra seja mais comumente mencionada nas religiões teístas, o fato de que quase sempre renascemos como seres não humanos, dada a raridade do renascimento humano, a mordomia não está muito longe do que o budismo defende para o mundo global. meio Ambiente.
Existem profundas afinidades potenciais entre o pensamento budista e uma economia verde inclusiva, da qual a bioeconomia amazônica é apenas uma parte. Os fundamentos filosóficos e éticos da economia verde são baseados na definição global da Green Economy Coalition de uma economia que “oferece prosperidade para todos dentro dos limites ecológicos do planeta”. Tal economia:
1. Permite que todas as pessoas criem e desfrutem da prosperidade;
2. Promove a equidade entre e dentro das gerações;
3. Salvaguarda, restaura e investe na natureza;
4. Apoia o consumo e a produção sustentáveis; e
5. É orientado por instituições integradas, responsáveis e resilientes.(Coalizão Economia Verde)
Desde o mapeamento de sistemas produtivos e formação de capital humano para a biodiversidade até o desenvolvimento de financiamento híbrido, mecanismos de governança e cadeias de valor sustentáveis por meio de políticas públicas – não faltam desafios que devem ser enfrentados à medida que o mundo busca novas formas de vislumbrar o futuro. Não há dúvida de que nossa turbulência global é, de alguma forma, reflexo do caminho sombrio para o qual a humanidade está se inclinando quando se trata de ecologia planetária. Além de Bolsonaro e Lula, além do Brasil, parece fundamental que o mundo caminhe em direção a uma economia verde inclusiva, com bioeconomias estabelecidas não apenas para os pulmões da Terra, mas para o maior número possível de ecossistemas locais ao redor do mundo. Em vez de ver a economia e o meio ambiente como forças opostas, nunca houve um momento mais urgente para ver a “prosperidade planetária” como a melhor esperança do nosso mundo.
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Análise: derrota nas eleições de Bolsonaro pode reduzir o desmatamento da Amazônia brasileira em 89% (Resumo de Carbono)
Como a bioeconomia amazônica pode catalisar uma economia verde inclusiva (Instituto Internacional para o Desenvolvimento Ambiental)
Coalizão Economia Verde
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