Tem havido muito pouco o que comemorar no Brasil ultimamente. O gigante latino-americano se tornou o epicentro global da pandemia do coronavírus, sofrendo um número recorde de mortes no mês passado e mais novas infecções do que qualquer outro país.
Ainda assim, na semana passada, pouco antes do aniversário do golpe militar de 1964 que deu início a uma longa ditadura, o ministro da Defesa e os três comandantes das Forças Armadas inesperadamente deram motivos para aplausos. Eles repentinamente se separaram do presidente de extrema direita Jair Bolsonaro em uma demonstração de lealdade à constituição democrática.
Bolsonaro já desencadeou uma grave crise de saúde ao passar o ano passado minimizando a importância da pandemia, resistindo ao uso de máscaras, zombando da vacinação e recusando-se a implementar bloqueios.
A esse recorde nada invejável, o mercurial ex-capitão do exército acrescentou uma crise com os poderosos militares do Brasil. Supostamente seus aliados, as forças armadas foram cortejadas por Bolsonaro com centenas de cargos no governo – incluindo a vice-presidência e quase metade do gabinete – bem como aumentos generosos nos gastos militares.
No entanto, quando o presidente pediu “minhas forças armadas” para ajudá-lo a resistir às tentativas de governadores e prefeitos de impor bloqueios, os generais hesitaram. Tendo a escolha entre mostrar lealdade a um presidente errático e imprevisível que desprezou abertamente o Congresso e os tribunais ou jurar fidelidade à constituição do Brasil, eles sabiamente escolheram a última opção.
O ministro da defesa de saída, Fernando Azevedo e Silva, foi nomeado por Bolsonaro e os dois homens eram próximos. Ainda assim, em sua carta de despedida, o general fez questão de dizer que havia “preservado as Forças Armadas como instituições do Estado”.
O compromisso dos chefes das Forças Armadas com a institucionalidade segue a firmeza louvável da Suprema Corte em resistir às tentativas de Bolsonaro de assumir poderes de emergência ou de vetar bloqueios impostos pelas autoridades locais. O Congresso também se afirmou com um “aviso amarelo” ao governo de Bolsonaro para mudar de curso ou enfrentar um possível impeachment.
Muito ainda pode dar errado. Bolsonaro nomeou chefes militares substitutos, os quais ele espera que se mostrem mais flexíveis. Fã abertamente da ditadura brasileira de 1964-85, ele apareceu no ano passado em manifestações pedindo o fechamento do Congresso e da Suprema Corte. Isso despertou temores de que ele pudesse estar flertando com a ideia de suspender a democracia e governar por decreto com o apoio das forças armadas, como Alberto Fujimori fez no Peru em seu “auto-golpe”De 1992.
O Brasil terá uma eleição presidencial no próximo ano e os fracassos de Bolsonaro na pandemia estão prejudicando a economia e sua própria popularidade. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ainda é um ícone da esquerda brasileira apesar de um histórico duvidoso no governo, deve concorrer contra ele depois que a Suprema Corte anular suas condenações por corrupção.
A perspectiva de uma votação altamente polarizada entre a extrema direita e a esquerda tradicional levanta outra preocupação: se derrotado, Bolsonaro pode tentar uma reivindicação Trumpiana de uma eleição roubada e reunir seus partidários, incluindo tropas comuns e policiais, por um Assalto ao estilo do Capitólio em Brasília.
Esses temores podem ser exagerados. No entanto, Bolsonaro demonstrou repetidamente pouca consideração pela democracia ou pela vida de seus concidadãos. À medida que sua popularidade diminui e suas perspectivas de reeleição diminuem, aumenta o risco de ele apostar em um desafio aberto à democracia.
Em um ambiente tão febril, o firme compromisso dos comandantes militares, do Congresso e do judiciário em defender a quarta maior democracia do mundo é um sinal vital e positivo.
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