Uma linha principal de investigação policial sobre o desaparecimento de um jornalista britânico e de um funcionário indígena na Amazônia aponta para uma rede internacional que paga pescadores pobres para pescar ilegalmente no segundo maior território indígena do Brasil, disseram autoridades.
O jornalista freelance Dom Phillips e o oficial indígena Bruno Pereira foram vistos pela última vez na manhã de 5 de junho perto da Terra Indígena do Vale do Javari, que fica em uma área do tamanho de Portugal na fronteira com Peru e Colômbia.
Os dois homens estavam na comunidade de São Rafael e voltavam de barco para a cidade vizinha de Atalaia do Norte, mas nunca chegaram. A polícia disse no sábado que ainda estava analisando matéria humana encontrada na área onde o casal desapareceu.
A polícia também investiga um esquema de empresários locais, que pagam aos pescadores para entrar no Vale do Javari, pescar e entregar a eles.
Um dos alvos mais valiosos é o maior peixe de água doce com escamas do mundo, o pirarucu. Pesa até 200kg e pode chegar a 3m de comprimento. O pescado é vendido em cidades próximas, incluindo Leticia na Colômbia, Tabatinga no Brasil e Iquitos no Peru.
Uma pesca ilegal no vasto Vale do Javari dura cerca de um mês, segundo Manoel Felipe, historiador e professor local que também atuou como vereador. Para cada incursão ilegal, um pescador ganha pelo menos US$ 3.000.
“Os financiadores dos pescadores são colombianos”, disse Felipe.
“Em Letícia, todo mundo ficou bravo com Bruno [Pereira]. Este não é um pequeno jogo. É possível que tenham enviado um atirador para matá-lo.”
‘Briga pessoal’
O único suspeito conhecido dos desaparecimentos é o pescador Amarildo da Costa de Oliveira, também conhecido como Pelado, que está preso.
Ele nega qualquer irregularidade e disse que a polícia militar o torturou para tentar obter uma confissão, disse sua família à Associated Press.
Segundo relatos de indígenas que estavam com Pereira e Phillips, o pescador havia brandido um fuzil contra a dupla um dia antes do desaparecimento.
Pereira, que anteriormente liderou o escritório local da agência indígena do governo, conhecida como FUNAI (Fundação Nacional do Índio), participou de várias operações contra a pesca ilegal.
Nessas operações, via de regra, as artes de pesca são apreendidas ou destruídas, enquanto os pescadores são multados e detidos brevemente, pois somente os indígenas podem pescar legalmente em seus territórios.
O funcionário da FUNAI Maxciel Pereira dos Santos foi morto a tiros em 2019 na frente de sua esposa e nora. Três anos depois, o crime continua sem solução. Seus colegas da Funai disseram à AP que acreditam que o crime está ligado ao seu trabalho contra pescadores e caçadores furtivos.
“O motivo do crime é uma briga pessoal pela fiscalização da pesca”, especulou aos jornalistas o prefeito de Atalaia do Norte, Denis Paiva, sobre os desaparecimentos sem dar mais detalhes.
Enquanto alguns policiais, o prefeito e outros da região associam os desaparecimentos da dupla a uma “máfia do peixe”, a Polícia Federal não descarta outras linhas de investigação. A área tem forte atividade de narcotráfico.
O pescador Laurimar Alves Lopes, 45 anos, que mora às margens do rio Itaquaí, onde a dupla desapareceu, disse à AP que desistiu de pescar ilegalmente dentro do território indígena após ser detido três vezes. Ele disse que foi levado para a sede local da Polícia Federal em Tabatinga, onde foi espancado e deixado sem comida.
“Cometi muitos erros, roubei muito peixe… Mas aí eu disse: vou acabar com isso, vou plantar”, disse em entrevista em seu barco.
Monica Yanakiew, da Al Jazeera, relatando uma vigília realizada para os dois homens desaparecidos no Rio de Janeiro, disse que a sogra de Phillips, que estava no evento, disse que “não tinha esperança de que eles fossem encontrados vivos”, embora a busca estava em andamento com “todas as mãos no convés”, incluindo jornalistas que se juntaram ao esforço para encontrar os homens desaparecidos.
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