Na semana passada, Eduardo Bim, presidente do órgão ambiental Ibama, autorizou o governo federal brasileiro a começar a repavimentação da rodovia BR-319 entre as cidades de Manaus, no Amazonas, e Porto Velho, na vizinha Rondônia, uma rota que corta a área mais intocada da floresta amazônica do país.
A decisão foi imediatamente criticada por grupos ambientalistas que afirmam que a repavimentação da via estimularia o desmatamento.
O projeto da rodovia foi originalmente parte fundamental de um plano da ditadura militar do país para desenvolver a área selvagem e integrá-la ao resto do país. Foi inaugurado oficialmente em 1976, mas a má manutenção levou ao seu abandono em 1988. Desde então, a estrada foi apenas parcialmente utilizável.
O grupo também apontou uma ligação entre alguns trechos bem conservados da estrada e níveis mais altos de tráfego, “ocupação” e desmatamento na Amazônia.
“As atividades de monitoramento e fiscalização realizadas pelos órgãos ambientais na região mostraram que o processo de ocupação desordenada, associado aos altos índices de desmatamento, se intensificou nos últimos meses”, escreveram.
“Isso é particularmente notável em cada extremidade da BR-319, onde o asfalto está em boas condições, o tráfego é intenso e o desenvolvimento da estrada incentivou sua ocupação”, continua o documento.
O documento, publicado em 2008, também recomendava dez “pré-condições” para a pavimentação da rodovia, incluindo a criação de áreas protegidas ao longo dos mais de 400 km de estrada a ser pavimentada e a criação de programas de ecoturismo envolvendo as comunidades locais.
“É impossível não apontar (essas) recomendações adicionais a serem consideradas como pré-condições pelo Governo Federal” antes do início das obras, acrescenta.
O Observatório do Clima disse que especialistas do IBAMA emitiram recomendações semelhantes em julho, mas a liderança da agência também as ignorou.
Os críticos da decisão foram rápidos em apontar o momento da decisão, observando que o Brasil está caminhando para novas eleições neste outono, onde o presidente Jair Bolsonaro deve enfrentar o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva.
Bim é indicado por Bolsonaro, que fez da pavimentação da estrada uma promessa de campanha nas eleições de 2018. Os presidentes anteriores também prometeram repavimentar e reabrir totalmente a rodovia, incluindo Da Silva.
“A decisão é claramente politicamente motivada” e o projeto é motivo de “grande preocupação”, disse Fernanda Meirelles, secretária-executiva do Observatório BR-319, uma ONG criada para impulsionar o desenvolvimento sustentável da região rodoviária.
A CNN entrou em contato com o IBAMA para comentar, mas não recebeu resposta.
O ministro da infraestrutura do Brasil, Marcelo Sampaio, comemorou a decisão como “resultado da coragem e do trabalho técnico” em um post no Twitter.
“Vamos tirar a sociedade amazonense do isolamento”, escreveu ele, referindo-se ao estado brasileiro do Amazonas.
Embora a nova licença efetivamente dê luz verde ao projeto de repavimentação do ponto de vista ambiental, ela não inclui disposições para as 10 medidas de conservação recomendadas pelas autoridades em 2008.
De acordo com os termos da licença, as inspeções serão a única medida destinada a limitar o impacto ambiental da estrada, que atravessa uma vasta área remota no noroeste do Brasil.
“As operações de fiscalização são insuficientes para conter a grilagem, invasões, desmatamento e especulação fundiária, pressões que aumentaram exponencialmente nos últimos anos (na zona)”, disse Meirelles.
Organizações da sociedade civil estão planejando pressionar para que a decisão do IBAMA seja cancelada na Justiça, de acordo com Suely Araujo, especialista em políticas públicas da ONG Observatório do Clima.
“A licença nem exige a instalação de postos de fiscalização (ao longo da estrada). Não há garantia de que o desmatamento na região será controlado quando a estrada for construída”, disse Araujo em nota.
“Como o desmatamento é o principal impacto negativo associado à pavimentação, a declaração de viabilidade da obra, que é inerente a todas as licenças prévias, não está devidamente fundamentada. É uma licença que deve ser anulada judicialmente”, acrescentou.
A floresta amazônica do Brasil foi desmatada em uma quantidade recorde no primeiro semestre de 2022, de acordo com o Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) do país.
Dados de satélites do INPE mostram que 3.750 quilômetros quadrados da maior floresta tropical do mundo foram perdidos no Brasil entre 1º de janeiro e 24 de junho, a maior área desde 2016, quando o instituto iniciou esse tipo de monitoramento.
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