O país não está “quebrado” – países, mesmo que estejam em situação fiscal pior que a do Brasil, não quebram. O discurso do Presidente Jair Bolsonaro, aos apoiantes reunidos no parque infantil do Palácio do Alvorada, nesta terça-feira (5), mostra duas coisas: 1) querer tirar o corpo dos problemas que cabem a um presidente enfrentar: 2) Bolsonaro não entende nada de economia.
Que o Bolsonaro não entende de economia, ele mesmo sempre deixou isso muito claro, não uma, mas infinitamente, ao referir as questões da área ao seu “Posto Ipiranga”, o ministro da Economia, Paulo Guedes. Paulo Guedes está de férias.
Uma pessoa ou empresa é quebrada quando suas dívidas superam em muito a capacidade de obter dinheiro para pagá-las. Os países não se rompem, mesmo com dívidas públicas elevadas e / ou déficits públicos elevados, como é o caso do Brasil, porque podem emitir dinheiro – não tanto imprimindo notas, mas principalmente endividando-se mais. Além disso, podem ampliar a arrecadação arrecadando impostos de quem sonha e de quem paga menos do que pode contribuir.
Sim, existem limites para ambas as hipóteses. As dívidas podem ser roladas pelo Tesouro Nacional com a colocação de títulos públicos, parte dos quais deve ser, obrigatoriamente, por leis, decretos e portarias, absorvida por fundos de investimento privados e outras aplicações. Mas é claro que, a partir de um certo volume muito alto, essa rolagem obriga o governo a pagar juros mais altos, o câmbio pode se contaminar e a inflação vai subir. Ao final do ciclo, a atividade econômica pode acabar travada e até regredir. Insistir em aumentar os gastos públicos, em uma situação limite como a descrita, não é um caminho viável.
A arrecadação de impostos também não pode ser ilimitada. Depois de um certo nível de contribuição, os incentivos para fugir ou fugir das rendas aumentam. A partir de certo ponto, é até possível que taxas mais altas resultem em volumes menores de coleta.
Mais do que o fato de que, por definição, países não rompem, o Brasil não é rompido porque esses limites de dívida ainda não foram atingidos. Antes, e mais importante, o Brasil não tinha, como nas décadas de 1980 e 1990, dívida significativa em moeda estrangeira. As reservas internacionais brasileiras cobrem dívidas externas. Quando os problemas dependem apenas de soluções em moeda local, como é o caso do Brasil, é ainda mais inapropriado falar de um país quebrado.
A questão fiscal, que está na base da ideia de um país quebrado, pode ser resolvida de várias maneiras. Aqui está apenas um exemplo: só em subsídios e isenções fiscais para setores e empresas, o Brasil gasta mais de R $ 300 bilhões por ano. Esse valor é um pouco superior ao gasto total em 2020, com o ajuda de emergência.
Alguns desses subsídios e isenções são justificados. O incentivo que incluem visa desenvolver segmentos e setores, que podem resultar em mais empregos, mais renda e, no final, mais impostos, excedendo o gasto com subsídio ou isenção. Mas hoje, existem poucos, muito poucos desses casos. Alguns, como os concedidos pelo Bolsonaro aos jogos, não se justificam e, como tantos outros, apenas atendem aos interesses de grupos privilegiados.
O Imposto de Renda, mencionado por Bolsonaro, está cheio de distorções. A tributação é mais pesada no meio da pirâmide de renda, levando a classe média mais para empregos formais e deixando os ricos de fora. Lucros recebidos por acionistas de empresas, por exemplo, não são tributados. No mundo todo, só no Brasil e na Estônia é assim.
Nosso sistema tributário é tão distorcido que quem recebe até dois salários mínimos contribui com metade de sua renda, enquanto quem ganha mais de 30 salários mínimos é tributado com 25% de sua renda. Isso se deve ao fato de que, no Brasil, o consumo é muito mais tributado do que a renda e a riqueza.
Essa distorção é tão nítida que, observando com olhos benignos, mostra que há um enorme espaço para mudanças no Imposto de Renda, com ou sem país “quebrado”. Na verdade, a mudança pode até ajudar a tornar o país menos “quebrado”.
Bolsonaro não altera o Imposto de Renda porque não sabe, reconhecidamente, do que está falando. E também porque, de fato, ele não quer.
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